quinta-feira, 22 de junho de 2017

Adhesão ao governo de João Franco

Em 2 de maio de 1907, os progressistas deixaram de apoiar João Franco que, não podendo governar à inglesa, passou a fazê-lo à turca, como então se dizia [...] (1)

Retrato de João Franco (detalhe), Julio Costa, 1903.
Imagem: DuasCidades

O sr. Presidente do Conselho recebeu hontem uma commissão de habitantes do concelho de Almada, que lhe entregaram uma mensagem de inteira adhesão á obra do governo, e que o sr. Conselheiro João Franco agradeceu, profundamente reconhecido por tão importante e significativa manifestação, assegurando que o gabinete continuará cumprindo honradamente o seu dever.

O ministério de João Franco, 1906.
Imagem: Wikipédia

A commissão foi apresentada pelo illustre chefe do partido regenerador-liberal n'aquelle concelho, sr. Manuel Figueira Freire da Camara e era com posta pelos srs. Raymundo Monteiro Torres, Antonio Serra, Antonio Joaquim Alves Valladares, tenente Guilherme de Azevedo, Manuel Joaquim Ribeiro, D. Francisco de Mello e Noronha, dr. Domingos Antonio Lopes, Ricardo da Silva, Elisiário Augusto de Passos Monteiro, Antonio Augusto Teixeira da Silva, Antonio Fernandes Martins, Carlos Silva, Manuel Henriques, dr. Camacho, Epiphanio Augusto Gonçalves, Bernardino Pinto, Manuel Carlos, Luiz Augusto Correia Salgueiro e João Danino, etc. 

Essa mensagem é do seguinte teor:

"Il.mo Ex.mo Sr. Conselheiro João Franco Castello Branco, Presidente do Conselho de Ministros e Ministro do Reino.

Os habitantes do concelho de Almada, adiante assignados, pertencentes a todas as classes sociaes, veem, sem preoccupações de politica partidaria, trazer ao governo, a que V. Ex.a tão dignamente preside, a adhesão, que elle tem subido merecer, pelas suas acertadas medidas para a regeneração económica, administrativa e politica do paiz.

A Paródia, n° 173, 15 de dezembro de 1906.
Imagem: Hemeroteca Digital

Muitos o calorosos teem sido os applausos á obra consciente, honesta e bem orientada dos homens do governo, porque o paiz, cançado de promessas faceis e raramente realisadas, está hoje seguro de que o seu único pensamento é, como V. Ex.a bem disse no discurso que corre impresso: 'dar satisfação ás aspirações e interesses nacionaes e ser instrumento de civilização e progresso.'

A Paródia, n° 186, 6 de abril de 1907.
Imagem: Hemeroteca Digital

Conscientes d'isto e não devendo ficar indiffcrentes perante o movimento geral, manifestado em favor do governo, os abaixo assignados veem depor esta mensagem, simples mas sincera, nas mãos de V. Ex.a

Almada, 1 de agosto de 1907."

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Também em nome do conselho de Almada foi entregue ao chefe do governo esta outra mensagem:

"Il.mo Ex.mo Sr. Conselheiro João Franco Castello Branco, Presidente do Conselho de Ministros:

No discurso lido por El Rei na sessão solemne da abertura das cortes em 29 de setembro do ultimo anno [v. abaixo], o governo, a que V. Ex.a nobremente preside, afirmou o proposito do transferir o Arsenal de Marinha, hoje insufficientemente dotado e sem a amplitude precisa, para a margem sul do Tejo, de modo a collocal-o em condições do poder corresponder ás exigencias da moderna technica naval.

Retrato de D. Carlos I (detalhe), Roque Gameiro, 1902.
Imagem: Tribunal de Contas

Conseguido isto, que seria bastante, por si só, para honrar uma administração, o governo, que tão empenhado está em gerir bem os negocios públicos, terá satisfeito uma aspiração nacional muito instante, uma necessidade publica imperiosa, e sobejamente merecido o reconhecimento do paiz.

Com um arsenal capazmente montado, será mais viável o desenvolvimento da nossa marinha de guerra, que tanto urge pôr em estado de poder, pelo valor e pelo numero das suas unidades de combate, cooperar activa e proveitosamente na defesa das costas do reino e do nosso património colonial.

Navios da Marinha de Guerra Portugueza no alto mar, Alfredo Roque Gameiro, 1903.
(Da esq. para a dir., cruzador Vasco da Gama, cruzador D. Carlos I, torpedeiro n.°2, cruzador S. Raphael, cruzador D. Amélia, torpedeiro n.° 3, cruzador S. Gabriel, cruzador Adamastor.)
Imagem: europeana collections

Os capitaes que precisamos de dispender com as construcções e reparações navaes, reverterão em favor da economia nacional, não serão levados, como até aqui, ao estranjeiro; e muitos braços, a que a pobresa das nossas industrias particulares não pôde dar emprego, encontrarão trabalho no novo arsenal. 

Em frente da ponte do Arsenal de Marinha, J. Novaes Jr., c 1900.
Imagem: Internet Archive

Depois, é lastimável que, alliados da Inglaterra, a primeira potencia naval do mundo, não tenhamos um molhe do armamento a que possam atracar, para se reabastecerem, os grandes Couraçados; que não disponhamos d'uma grande doca de reparação onde, navios amigos, possam refazer-se das avarias soffridas n'uma acção naval; que não tenhamos, sequer, um lugar de abrigo onde, no estado de guerra, elles possam momentaneamente acolher-se para repousarem em segurança.

E sem isso, não poderá o porto do Lisboa, posto que magnificamente situado, servir de ponto de apoio verdadeiramente util a uma esquadra, como tanto interessa á nossa propria defesa.

Estudos completos, feitos por pessoa a quem se attribue elevada competência profissional, e já entregues na secretaria do ministério da Marinha, designam os terrenos, a conquistar ao Tejo, entre Mutella e o Alfeite, n'este concelho, como ser os preferidos, tanto sob o ponto de vista technico como economico, para a installacão do arsenal. 

Futuro Arsenal de Marinha na outra margem do Tejo.
Lisboa monumental, ilustração, Alonso (Joaquim Guilherme Santos Silva, 1871 — 1948).
Imagem: Hemeroteca Digital

Ocioso será, portanto, pedir ao governo de Sua Majestade que o arsenal alli seja estabelecido.

O concelho de Almada, tão favorecido pela natureza, mas tão carecido de progressos materiaes, bem merece esse importante melhoramento, que virá augmentar consideravelmente a sua população, desenvolver o seu commercio e valorisar a propriedade. O pais ficará contando, certamente, uma cidade a mais. Elevando-se, eomo elevarão sensivelmente, os rendimentos do concelhos, poder-se-hia modificar as condições materiaes e económicas das suas povoações, que ha muito reclamam beneficios úteis e até urgentes, mas que os recursos financeiros do município não teem deixado, por muito escassos, realisar. 

A grande ponte para caminhos de ferro e peões entre as duas Lisboas do futuro.
Lisboa monumental, ilustração, Alonso (Joaquim Guilherme Santos Silva, 1871 — 1948).
Imagem: Hemeroteca Digital

Resta-nos ainda uma solicitação a faser ao governo de Sua Majestade: que seja mandado executar, com a urgência que as circumstancias reclamam, o prolongamento do caminho de ferro do Barreiro a Cacilhas, cuja necessidade é evidente.

As communicações entre Lisboa e o Barreiro, sobre serem relativamente demoradas, offerecem dificuldades, mormente em occasiõos de nevoeiro, que não apresentam, ou que são, pelo menos, consideravelmente attenuadas, para Cacilhas. Bastará considerar que, para o Barreiro, a navegação tem de fazer-se, em grande parte, por um canal.

Cacilhas, Molhe e pharol, ed. Martins/Martins & Silva (para editor local), 19, c. 1905.
Imagem: O Pharol

É notorio, além d'isso, que a estação do Barreiro já não satisfaz ás necessidades do trafego, tendo succedido ficarem mercadorias de fácil detereoração em caes descobertos ou nas linhas de resguardo, expostas á acção do tempo. E não será fácil, sem largos sacrifícios, accommodar aquella estação ás exigências actuaes. 

Pôde, de resto, prever-se com segurança que o capital a dispender pelo Estado com a linha ferrea do Barreiro a Cacilhas terá uma remuneração largamente compensadora.

Projecto de aterro dockas e caminho de ferro que devem ser construídos na bahia formada pelas águas do Tejo Barreiro e Cacilhas (detalhe), Jayme Lorches, 1860.
Imagem: Biblioteca Nacional de Portugal

N'estas condições, os abaixo assignados, habitantes do concelho de Almada, ou n'elle possuindo interesses, ficam esperançados em que o Governo a que v. ex.a dignamente preside attenderá, por que é justa, a representação que, sem preoccupações partidárias, veem depôr nas mãos de v. ex.a

Deus guarde a v. ex.a — Almada, 1 de agosto de 1907. (2)


(1) Politipédia
(2) Diario Illustrado, quinta-feira 8 de agosto de 1907

Informação relacionada:
Governo de João Franco (1906)

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O discurso lido por El Rei [D. Carlos] na sessão solemne da abertura das cortes em 29 de setembro [de 1906]:

"Dignos Pares do Reino e Senhores Deputados da Nação Portuguesa:

No cumprimento do Meu dever de Rei Constitucional venho hoje abrir uma nova época legislativa, felicitando-Me por poder consignar perante os representantes da Nação a cordialidade das relações de Portugal com todas as outras potências.


Retrato de D. Carlos I, Roque Gameiro, 1902.
Imagem: Tribunal de Contas

Com algumas delas existem, dependendo da aprovação parlamentar, convenções e acordos de interesse recíproco sobre que oportunamente tereis de deliberar; com outras estão pendentes negociações para a realização de tratados de comércio.

Tendo sido dissolvida a Câmara dos Senhores Deputados, procedeu-se a novas eleições gerais, aprazendo-Me constatar a perfeita ordem e inteira liberdade com que foram realizadas.


Na execução do seu programa político e administrativo, cujo desenvolvimento na parte dependente do Poder Legislativo sucessivas propostas de lei irão acentuando, o Meu Governo começará por vos apresentar importantes medidas que carecem da vossa atenção e estudo. Assim, à proposta de lei aprovando o contrato provisório celebrado com a Companhia dos Tabacos de Portugal, que, pela urgência do assunto, vos será em primeiro lugar apresentada, seguir-se-ão, como bases fundamentais da regularização da administração pública, as propostas de lei sobre responsabilidade ministerial e reforma da contabilidade, procurando assegurar por esta forma a ordem moral e material nos serviços do Estado.


Pela pasta do Reino, na parte propriamente administrativa e política, vos serão apresentadas propostas: - reconhecendo a urgência da reforma de alguns artigos da Carta Constitucional e Actos Adicionais; estabelecendo um novo regime eleitoral, com o regresso ao sistema dos círculos uninominais, alargamento da elegibilidade aos membros das classes trabalhadoras e entrega do recenseamento e das operações eleitorais ao Poder Pela pasta do Reino, na parte propriamente administrativa e política, vos serão apresentadas propostas: - reconhecendo a urgência da reforma de alguns artigos da Carta Constitucional e Actos Adicionais; estabelecendo um novo regime eleitoral, com o regresso ao sistema dos círculos uninominais, alargamento da elegibilidade aos membros das classes trabalhadoras e entrega do recenseamento e das operações eleitorais ao Poder Judicial; remodelando o Juízo de Instrução Criminal, de forma a tornar eficaz a responsabilidade dos seus funcionários e instituindo o princípio da instrução contraditória; dispensando a autorização do Governo para o prosseguimento dos processos criminais contra funcionários; garantindo a liberdade de associação; e abolindo os passaportes, excepto para os emigrantes Pela pasta do Reino, na parte propriamente administrativa e política, vos serão apresentadas propostas: - reconhecendo a urgência da reforma de alguns artigos da Carta Constitucional e Actos Adicionais; estabelecendo um novo regime eleitoral, com o regresso ao sistema dos círculos uninominais, alargamento da elegibilidade aos membros das classes trabalhadoras e entrega do recenseamento e das operações eleitorais ao Judicial; remodelando o Juízo de Instrução Criminal, de forma a tornar eficaz a responsabilidade dos seus funcionários e instituindo o princípio da instrução contraditória; dispensando a autorização do Governo para o prosseguimento dos processos criminais contra funcionários; garantindo a liberdade de associação; e abolindo os passaportes, excepto para os emigrantes.


Ainda pela mesma pasta, no capítulo da instrução, a que o Meu Governo dedica o maior interesse, vos serão submetidas duas propostas de lei: - tendo uma por fim a reorganização dos serviços da instrução pública na sua parte directiva e dando ao Conselho Superior uma acção mais larga e eficaz, tanto na organização do ensino como na escolha e garantias do professorado, e à Universidade de Coimbra, às escolas superiores e ainda a outros institutos principais de ensino uma autonomia e independência não só pedagógica, mas económica; e ficando, pela outra, autorizado o Governo a mandar ao estrangeiro, para complemento da sua instrução não só os estudantes pobres que hajam dado provas distintas de capacidade e aplicação, mas também os professores primários e de algumas disciplinas do ensino secundário que se mostrem especialmente aptos para adquirirem o conhecimento e prática dos melhores processos pedagógicos.


Pela pasta da Justiça, além da lei de responsabilidade ministerial, ser-vos-à apresentada uma proposta assegurando melhor a independência do Poder Judicial, separando as duas magistraturas - Judicial e do Ministério Público - e fazendo reverter para o Estado as custas dos processos criminais em Lisboa e no Porto, com a respectiva compensação para os magistrados e empregados de justiça. Também pela mesma pasta vos serão presentes medidas reformando a lei de liberdade de imprensa, remodelando a legislação actual sobre delitos de anarquismo, e estabelecendo um processo especial para a cobrança das pequenas dívidas.


Não descura o Meu Governo o progressivo aperfeiçoamento das instituições militares, e neste sentido, pelas pastas da Guerra e da Marinha, vos apresentará uma proposta de lei para a organização do Supremo Conselho de Defesa Nacional, tendo por fim assegurar a preparação da guerra e a estabilidade das organizações militares de terra e mar.


Pela pasta da Guerra vos serão apresentadas propostas: remodelando os tabeliães de vencimentos dos oficiais do exército e da readmissão das praças de pret; reorganizando a Escola do Exército e o Curso do Estado-maior; criando um colégio para filhos dos oficiais inferiores; modificando as condições da reforma dos sargentos e sargentos-ajudantes; remodelando a lei das servidões militares; alterando provisoriamente as condições de promoção dos tenentes de artilharia; reorganizando o Campo Entrincheirado de Lisboa; e difundindo a instrução militar preparatória em todo o país.


Igualmente chamo a vossa atenção e solicitude para as importantes questões dependentes da pasta da Marinha, tanto no que respeita aos serviços propriamente marítimos, como aos problemas da administração ultramarina. Quanto aos primeiros o Meu Governo vos apresentará medidas para a organização da marinha colonial; para a instalação do Arsenal de Marinha na margem esquerda do Tejo; para a organização da defesa móvel; para a supressão das Escolas de Alunos Marinheiros, organizando, em sua substituição, a instrução profissional da marinha mercante nos departamentos marítimos e preparando o início dos trabalhos da carta hidrográfica e das cartas de pesca; e, finalmente, para a protecção e desenvolvimento, da indústria nacional da pesca.

Quanto ao Ultramar apresentar-vos-à o Meu Governo medidas de carácter geral, como é a organização administrativa das diversas províncias, com uma descentralização diferenciada; e a correlativa organização militar, em bases mais económicas e com a separação das funções que correspondem às tropas ultramarinas das que só podem competir ao exército da metrópole; e medidas de interesse e fomento especial de certas províncias e regiões, como são a organização dos serviços e melhoramentos do porto de São Vicente de Cabo Verde e as tendentes ao alargamento da irrigação agrícola no Estado da Índia e à construção do caminho-de-ferro de Quelimane.


Como fundamento imprescindível e essencial para orientar e coordenar a intervenção dos corpos legislativos nos problemas do fomento nacional, oportunamente vos será presente pela pasta das Obras Públicas o relatório económico em que, coligindo-se numerosos elementos de informação dispersos por varias repartições e serviços, pela primeira vez se procura, de uma forma geral, estudar e definir as forças naturais, industriais e de acumulação que constituem a economia do país, precisar a influência da acção directa ou indirecta do Estado e formular as conclusões que se antolhem mais conformes ao proveitoso movimento dos variados factores económicos.

Como seu complemento e natural corolário, vos serão presentes propostas actualizando a legislação sobre propriedade industrial; modificando o ensino agrícola em proveito de uma melhor difusão das noções elementares de técnica rural, por meio das cátedras ambulantes; procurando a maior utilização profissional do nosso ensino industrial; e outras moldadas no mesmo intento de fazer coincidir a legislação com as características peculiares à nossa organização económica.


Dentro da mesma convergência de propósitos, como satisfação imediata a instantes razões de conveniência pública, serão primariamente submetidas ao vosso exame propostas regulando a exportação e comércio de vinhos generosos, que o Douro tanto e tão justamente reclama; fixando o regime para exploração e administração do porto de Lisboa; e providenciando sobre classificação, conservação e reparação das estradas nacionais.

Atendendo a uma alta questão de justiça social e de utilidade pública, no seu mais largo sentido, propor-vos-à o Governo a criação de uma caixa de aposentações para as classes operárias e trabalhadoras, seguindo assim na esteira das reformas sociais iniciadas em todos os países cultos.

E atendendo também às precárias condições económicas do funcionalismo público vos apresentará uma proposta de lei extinguindo o imposto de rendimento da lei de 26 de Fevereiro de 1892 sobre vencimentos não superiores a 600$000 reis e reduzindo a metade esse imposto sobre todos os outros.

No mesmo intuito vos será presente uma proposta elevando os ordenados dos aspirantes, amanuenses e segundos oficiais das Secretarias de Estado, começando assim o Governo a realizar o seu pensamento de melhorar sucessivamente, sem ocasionar perturbações financeiras, as condições de algumas classes do funcionalismo, especialmente nos graus inferiores.

Não tendo sido aprovado ainda o orçamento para o actual ano económico, entrou em execução, como o estabelecem as leis constitucionais, o orçamento de 1904-1905, último que obteve a sanção legislativa. Ainda no cumprimento dessas leis o Meu Governo vos submeterá o orçamento para o ano económico corrente, no qual tanto as receitas como as despesas vão calculadas por forma rigorosa e exacta e se descrevem em capítulo especial, para melhor estudo do parlamento, as despesas que o Governo encontrou criadas em virtude de diplomas susceptíveis de discussão.


A conversão da Dívida Pública Interna, a reforma do contrato vigente com o Banco de Portugal, a remodelação das disposições relativas a Companhias de Seguros, a desamortização dos bens da Companhia das Lezírias do Tejo e Sado, o estabelecimento de uma carreira de navegação nacional para o Brasil - são outros tantos problemas de carácter financeiro e económico para a solução dos quais o Governo vos apresentará propostas de lei.


A renovação da proposta sobre a pauta das alfândegas dará ensejo a que possa ser devidamente apreciado e resolvido um assunto que, pela sua importância, complexidade e larga incidência sobre os mais variados ramos da actividade nacional, reclama a mais acurada atenção e a mais ampla cooperação e iniciativa parlamentar.


Dignos Pares do Reino e Senhores Deputados da Nação Portuguesa:


O simples enunciado dos trabalhos e problemas que nesta sessão vão ser submetidos ao vosso estudo e aprovação marca bem a grandeza da tarefa que vos está confiada. Espero, porém, que, com o auxílio de Deus, a vossa ilustração e a própria consciência das responsabilidades que tendes para com o País vos animarão a colaborar numa obra de larga regeneração nacional que abra à nossa Pátria uma nova era de prosperidade e grandeza moral.

Está aberta a sessão."

terça-feira, 20 de junho de 2017

Pancadaria

Uma senhora de Lisboa, tendo, de ir á Piedade, alugou em Cacilhas, um cavallo. Na volta, quando chegou a Mutella desequilibrou-se e deu uma grande queda, ficando bastante contusa.

Almada, vista sul, Joaquim Possidónio Narcizo da Silva, 1862.
Imagem: Biblioteca Nacional de Portugal

Na occasião passavam dois actores do theatro do Principe Real em um trem, e apeando-se metteram a senhora no trem, montando em seguida os dois no cavallo.

Selo dos Templários mostrando dois cavaleiros num só cavalo.
Imagem: Wikipedia

Quando chegaram a Cacilhas apparece-lhes o dono do cavallo, que depois de pequena altercação puchou por uma perna de um dos cavalleiros que bateu com as costas na calçada arrastando o companheiro na queda.

Trens de aluguer em Cacilhas, c. 1907.
Imagem: Alexandre Castanheira, Romeu Correia, Memória Viva de Almada, Câmara Municipal de Almada, 1992

Escusado é dizer que, levantando-se irados, saltaram no espinhaço do atrevido cacilheiro, desancando-o muito soffrivelmente.

Cacilhas (Portugal), Largo do Costa Pinto, ed. Martins/Martins & Silva, 18, década de 1900
Imagem: Delcampe

Acode, porém, um bando de burriqueiros, cada um com seu cacete, que certamente teriam feito n'um feixe as costellas dos dois actores, se não apparece o official Vidigal que auxiliado por alguns soldados do destacamento de infanteria 2, apasiguou os desordeiros. 

Almada, Camara Municipal,
ed. Paulo Emílio Guedes & Saraiva, 11, década de 1900.
Imagem: Delacampe

Os actores foram recolhidos na cadeia d'Almada, onde passaram a noite. De manhã foram soltos com fiança. (1)


(1) Diario Illustrado, 22 de abril de 1883

quinta-feira, 15 de junho de 2017

Alfeite visto da Piedade em 1850

Será hoje difícil saber quantos álbuns de esboços o artista terá utilizado ao longo do seu acidentado percurso criativo. Mas, certamente, que Cristino [João Cristino da Silva] trazia sempre consigo, nas suas deambulações, um pequeno álbum onde, simultaneamente, ia desenvolvendo a atenção do olhar, disciplinando a destreza da mão e registando a impressão do momento.

João Cristino Silva, auto-retrato (detalhe).
Imagem: Arcadja

Um desses álbuns de desenho terá passado do seu filho, o também pintor João Ribeiro Cristino (1858-1948), para o seu neto, o arquitecto Luís Cristino da Silva (1896-1976), cujo espólio foi doado à Fundação Calouste Gulbenkian na década de 1980, encontrando-se actualmente no fundo documental da Biblioteca de Arte. 

Alfeite visto da Piedade [sic: Val feito - visto da piadade], João Cristino da Silva, Album de desenhos, c. 1850.
Imagem: Álbum de desenhos de João Cristino da Silva (1829-1877) no flickr

Ao longo das duas faces das 68 folhas de papel que o tempo amareleceu, o avô Cristino desenhou apontamentos a grafite e carvão da paisagem e da arquitectura dos locais – Sintra, mas também Cascais, Santarém, Leiria, Buçaco… – por onde se fez a sua vida, e dos elementos animais – burros, bois, vitelos – e vegetais que os habitavam. 

Burro cacilheiro, João Cristino da Silva, Album de desenhos, c. 1850.
Imagem: Álbum de desenhos de João Cristino da Silva (1829-1877) no flickr

São várias as cenas de costumes numa atenção ao pitoresco que caracterizou a pintura do Romantismo nacional. (1)


(1) Álbum de Desenhos, Biblioteca de Arte Gulbenkian

Informação relacionada:
Álbum de desenhos de João Cristino da Silva (1829-1877) no flickr

terça-feira, 13 de junho de 2017

Almada 1945-1965

Já não é difícil prognosticar o futuro da margem sul, sob os aspectos urbano, industrial, turístico, etc., porque se vé nitidamente a direcção do movimento, iniciado há cerca de 20 anos e que ultimamente se vem tornando cada vez mais firme.

Um dos actuais encantos de Almada está precisamente nos imprevistos aspectos que a cidade satélite nos desvenda: eis o velho e romântico petroleiro de carro puxado a mula, contrastando com a moderna linha dos edifícios.
Fotografia de António Homem Christo, in Almada, a cidade satélite, Revista Eva, Dezembro de 1960.
Imagem: Dias que Voam

A vila de Almada teria em 1940 sete ou oito mil habitantes, praticamente na totalidade oriundos de almadenses. Lisboa saltou o Tejo e desenvolveu rapidamente Almada, que transformou em cidade sua satélite e sua zona residencial. 

Almada, Vista Geral (tomada do Campo de S. Paulo), ed. desc., década de 1940.
Imagem: Delcampe, Bosspostcard

Não tardará muito que Almada atinja o décuplo da sua população de há um quarto de século. Quem como nós, viveu em Almada a maior parte deste espaço de tempo, viu rasgar avenidas e alinhar prédios pelas quintas que alastravam pelas encostas do Vale Caramujo-Caparica; 

Paisagem rural. A caminho de Caparica, década de 1940. Pintura de José de Azevedo (1914-2000).
Imagem: Alexandre Flores no Facebook

viu deslocar-se o centro cívico de Almada e modificar-se radicalmente o aspecto de Cacilhas; 

Plano Parcial de Urbanização de Almada (PPUA) relativo à localização do Cento Cívico, 1947.
Imagem: Câmara Municipal de Almada

viu regular-se a margem do rio entre Cacilhas e a Cova da Piedade;

Porto de Lisboa, vista aérea de Cacilhas e dos lugares de Ginjal e Margueira, década de 1950.
Imagem: Porto de Lisboa

viu surgir no Laranjeiro-Feijó um grande centro, que não tardará a ser freguesia independente; viu lançar as bases da fixação populacional com a criação de escolas médias particulares e oficiais e com o auspicioso início da construção de um dos maiores estaleiros do mundo.

Vista aérea da variante à Estrada Nacional 10, zona da Mutela e da Margueira, 1958
Imagem: IGeoE

Os últimos 20 anos abriram a Almada perspectivas inteiramente novas: — de pequeno burgo monolítico, constituído pelo aglomerado de algumas famílias conhecidas, passou a ser a cidade sem coesão, formada na maioria por emigrados imigrados provindos de todos os recantos do País.

Praça da Renovação, década de 1960.
Imagem: Delcampe

Sob o ponto de vista urbano, Almada tornou-se grande; sob o ponto de vista social, não enriqueceu com o mesmo ritmo; e perdeu a unidade que tinha dantes. Almada deixou de ser um meio pequeno, para residência e trabalho de vizinhos; agora é uma cidade cujos habitantes mútuamente se desconhecem. 

Almada, Cacilhas - Vista Parcial, ed. J. Lemos, s/n, década de 1950.
Vista da Avenida Frederico Ulrich, atual 25 de Abril, Vila Brandão e morro do moinho.
Imagem: José Luis Covita

É fácil de prever o progressivo encarecimento de rendas e a consequente fixação na zona de Almada de pessoas de um mais alto nível de vida. Em contrapartida, é fatal que mais longe venha a construir-se a zona habitacional de classes pobres, para a qual veremos partir, infelizmente, muito bons almadenses de hoje.

Transportando a água, Júlio Diniz, década de 1950.
Imagem: O Pharol

Sob o ponto de vista industrial, Almada aproveitará principalmente a sua privilegiada situação sobre a margem do Tejo, em grande parte ainda por explorar. Aparecerão, por certo, novas instalações portuárias, para passagem de mercadorias destinadas ao "além-Tejo" ou dali provenientes. 

Cacilhas, ed. Supercor, 1808, década de 1980.
Imagem: Delcampe

É natural que a política de fixação à terra não permita o estabelecimento de muitas indústrias de outra natureza tão próximo da capital. Mas é sob o ponto de vista turístico que Almada aguarda um grande futuro.

Cova do Vapor, vista aérea (detalhe), 1953.
Imagem: Flickr

Rica de praias e de matas, incomparáveis pela grandeza e pela beleza, c colocada como obrigatória porta de passagem para a extraordinária península de Setúbal, Almada poderá ter no turismo urna das suas grandes fontes de riqueza.

Costa da Caparica, O Transpraia, ed. Passaporte, 615
Imagem: Delcampe, Oliveira

É isto, em linhas muito rápidas, o que será o futuro próximo de Almada. — E o distante?

O Berlinde por um Óculo, fotografia de Fernando Barão.
Imagem: Casario do Ginjal

Para esse, cumpre-nos lançar os alicerces, para que os futuros habitantes o construam. (1)


(1) Jornal de Almada 07 de agosto de 1966

Artigos relacionados:
Almada em 1960
O centro cívico

terça-feira, 6 de junho de 2017

O Alfeite para escola liberal

Apareceram em alguns jornaes noticias ácerca da proposta de compra ao Estado do palacio do Alfeite, por um grupo de cidadãos liberacs de que fazem parte os srs. Tomaz da Fonseca, deputado e diretor das escolas normaes, Ferreira do Amaral, engenheiro, Francisco Grandela, comerciante, etc.

Recordação de uma "pandiguinha" na tapada do Alfeite em 28 de Setembro de 1913.
Imagem: Alexandra Reis Gomes Markl, António Ramalho, Pintores Portugueses, Lisboa, Edições Inapa, 2004

As mesmas noticias dizem que sobre este assunto, os interessados tem tido varias conferencias com o sr. ministro do fomento e que a oferta é de cem contos por esta propriedade.

Praia do Alfeite, António Ramalho, 1881.
Imagem: Alexandra Reis Gomes Markl, Op. Cit.

Como ilucidação cabe fazer aqui a breve historia desta propriedade, uma das mais rendosas que pertencia á corôa desde 1834.

Quando D. Afonso Henriques conquistou Lisboa, já esta propriedade existia com a denominação de Penha. D. Afonso doou-a então aos inglêses, que o ajudaram na conquista.

D. Sancho I fez passar esta propriedade aos cavaleiros da Ordem de S. Tiago, até que, no reinado de D. Diniz, foi encorporada nos bens da corta dando em troca áquela ordem as vilas de Almodovar c Ourique, e os castelos de Monchique e Aljesur.

Tejo junto à Praia do Alfeite, António Ramalho, 1880.
Imagem: Alexandra Reis Gomes Markl, Op. Cit.

D. Fernando I incluiu a Penha nos bens com que dotou sua mulher D. Leonor Teles, a qual, depois da morte do marido, os doou ao celebre judeu David Negro, almoxarife das alfandegas do reino.

Este judeu, seguindo o partido da rainha viuva, acompanhou-a na fuga para Alemquer, a isso obrigada pela revolta em favor do Mestre de Aviz.

Por este facto David Negro foi declarado traidor á patria e sequestrado-lhes todos os seus bens.

D. João I, ainda regente, doou a Penha ao seu companheiro de armas, o condestavel D. Nuno Alvares Pereira.

Pomar do Antelmo, Alfeite, António Ramalho, 1881.
Imagem: Alexandra Reis Gomes Markl, Op. Cit.

A mulher de David Negro, porém, sabendo desta doação, tentou embargal-a em nome dos filhos, e disto se originou uma demanda, que durou nove anos, terminando por urna composição, em que ela ficou com os bens de Almada, que compreendiam a Penha e o condestavel com os de Lisboa.

Mais tarde, conforme a tradição, D. Nuno Alvares Pereira comprou aos herdeiros de David Negro, aquela propriedade para a reunir a outras que possuia da outra banda do Tejo, até que, em 28 de julho de 1404, doou estes e outros bens que tinha á Ordem dc Santa Maria do Carmo. Foi depois desta doação que a propriedade da Penha passou a denominar-se do Alfeite.

Paisagem na Real Quinta do Alfeite, António Ramalho, 1881.
Imagem: Alexandra Reis Gomes Markl, Op. Cit.

Passam-se mais de dois seculos em que a propriedade do Alfeite sofreu varias alternativas e, só em 1697, parece que a adquiriu D. Pedro II, de Gerardo Huguer Marcem, que então estava de posse dela, e a incorporou na Casa do Infamado.

No reinado dc D. João V, o infante D. Francisco, a quem pertencia esta Casa, instituida por D. João IV, reuniu-lhe a quinta da Romeira, comprada, em 1707, ao conde de Tarouca, e mais outra que comprou ao desembargador Antonio da Maia Aranha.

Lavadeiras na Romeira, Alfeite, António Ramalho, 1881.
Imagem: Alexandra Reis Gomes Markl, Op. Cit.

D. Maria I aumentou os bens do Infantado com mais propriedades que lhes juntou, e D. Miguel, no 1.° de julho de 1833, arrematou a quinta da Piedade, que se ligava com as do Alfeite, e que depois passou á posse de Pompeu Dias Torres, negociante em Lisboa, que por sua vez a vendeu ao moageiro Antonio José Gomes, sendo hoje dos seus herdeiros.

A propriedade do Alfeite, com os seus palacios, compôe-se do Outeiro, Quintinha, Antelmo e Bomba, pertencendo-lhe tambem a vinha do Pagador, a Lagôa de Albufeira, os pinhaes de Corrolos e do Cabral, os moinhos do Gaivão, Passagem, Capitão e Torre. 

Em 1851 debateu-se na Camara dos Pares a questão do arrendamento da propriedade do Alfeite ao conde de Tomar — Costa Cabral — então presidente do conselho. Esse arrendamento era por 99 anos e por 2:500$000 réis anuaes. A quinta do Alfeite era naquele tempo um onus para a casa real, bem ao contrario do que hoje acontece, pois só a venda da arda extraida dos seus areiaes para as construç8es dc Lisboa e seu termo, constitue um rendimento importantissimo.

Paul da Outra banda, Pântano, Vista do Alfeite, Charco de Corroios, José Malhoa, 1885.
Imagem: Blog do Noblat

A questão a este respeito ventilada na camara alta foi das mais escandalosas, entre os partidarios de Costa Cabral e os adversarios á frente dos quaes se encontrava o marechal Saldanha. A ultima sessão em que este assunto foi debatido e em que o conde de Tomar pronunciou o seu ultimo discurso parlamentar, tomando a propria defesa, realisou-se em 22 de março de 1851. O parlamento foi encerrado e poucos dias depois iniciava o duque de Saldanha o movimento revolucionario conhecido pela Regeneração, que importou a queda do governo dc Costa Cabral e a este se exilar para o estrangeiro. 

Paço Real do Alfeite, Aguarela, Enrique Casanova
Imagem: Cabral Moncada Leilões

Em 1857 D. Pedro V fez grandes melhoramentos na quinta do Alfeite, e mandou construir o novo palacio mais elegante e confortavel do que o antigo, que cahira em ruinas, assim como no Antelmo, pertensa da mesma propriedade, que foi restaurada. 

Lago do Antelmo — Alfeite, João Ribeiro Cristino, 1883.
Imagem: Veritas leilões

Nos ultimos tempos, o palacio do Alfeite era utilisado pelo sr. infante D. Afonso e pela rainha sr.a D. Amelia, que ali ia passar alguns dias, no outono.

Alfeite (ao tempo) lugar da freguesia da Nossa Senhora da Piedade.
Imagem: Delcampe

A proposta que aparece agora para a compra desta propriedade, não deixa de fazer lembrar a que em 1851, o conde de Tomar tentou para o seu arrendamento, por 2:500$000 réis, talvez menos da quarta parte do rendimento só da areia que de ali se extrae anualmente. (1)


(1) Occidente n.° 1203, 30 de maio de 1912

Tema: Alfeite

quinta-feira, 1 de junho de 2017

Palacete de António José Gomes (monumento classificado)

A memória de António José Gomes, esclarecido industrial moageiro que muito contribuiu para o desenvolvimento e modernização da Cova da Piedade, é ainda hoje uma referência para a freguesia, aqui celebrada através da conservação da sua casa de habitação.

Cova da Piedade, Rua Tenente Valadim, ed. desc., década de 1900.
Imagem: Delcampe

O palacete, possivelmente erguido entre finais do século XIX e inícios do século XX, em terrenos da antiga Quinta da Piedade, uma das famosas "sete quintas" do Alfeite, abrindo a sua fachada para o largo principal da vila e para a sua igreja matriz, marca com a sua linguagem eclética, própria da burguesia em ascensão, a urbanidade contemporânea.

Cova da Piedade Palacete de António José Gomes.
Imagem: Alexandre Flores, António José Gomes: O Homem e O Industrial (1847 -1909)...

O estilo eclético e erudito do projeto, de influência francesa (Beaux-Arts), está bem patente na linguagem neoclássica dos elementos decorativos do exterior, com frontaria ritmada por pilastras e silhares rusticados ao nível do piso térreo conjugando-se com estruturas em vidro e ferro de feição Arte Nova, estas funcionando já como sinal de modernidade e do espírito progressista burguês, celebrado igualmente nas alegorias do Comércio e da Indústria que rematam o edifício.

Cova da Piedade. Palacete António José Gomes. esculturas alegóricas ao Comércio e à Indústria.
Imagem: Nuno Pinheiro

No interior, cuja decoração “excessiva” contrasta com a relativa sobriedade dos exteriores, destacam-se sobretudo as marcenarias, os estuques, as pinturas românticas e os vitrais revivalistas.

Cova da Piedade, Palacete António José Gomes, pormenor do tecto do salão principal.
Imagem: Alexandre Flores, António José Gomes: O Homem e O Industrial (1847 -1909)...

À esquerda da fachada principal ergue-se o volume da cocheira, também aberto para o jardim contíguo à fachada posterior, cercado por muro e gradeamento em ferro forjado e aberto por portão de cantaria rusticada, que delimita ainda um pavilhão para criação de animais e uma garagem.

Cova da Piedade. Alçados do “Chalet” Jorge Taylor, das cocheiras e do Palácio António José Gomes.
Imagem: Samuel Roda Fernandes, Fábrica de molienda António José Gomes

Pertencia à propriedade uma nora de ferro de desenho requintado, hoje situada em terrenos da Escola Preparatória da Cova da Piedade e classificada como de interesse municipal, que abastecia de água a quinta de António José Gomes.

Nora de ferro situada nos terrenos da Escola Preparatória da Cova da Piedade.
Imagem: Direção Geral do Património Cultural

A classificação do Palacete de António José Gomes, incluindo o jardim, instalações para animais, cocheira e garagem, reflete os critérios constantes do artigo 17.º da Lei n.º 107/2001, de 8 de setembro, relativos ao interesse do bem como testemunho notável de vivências ou factos históricos, ao seu valor estético, técnico e material intrínseco, à sua conceção arquitetónica e urbanística, e à sua extensão e ao que nela se reflete do ponto de vista da memória coletiva.

Cova da Piedade, Palacete António José Gomes. Vista geral de fachadas posteriores e campos fronteiros.
Imagem: Direção Geral do Património Cultural

A zona especial de proteção (ZEP) tem em consideração a envolvente urbana do imóvel, particularmente os espaços públicos e o edificado mais antigo, bem como a totalidade dos quarteirões que integram a área original da propriedade e a nora de ferro que lhe pertencia, e que constitui elemento evocador do passado rural deste território, e a sua fixação visa assegurar a integridade e as características fundamentais do seu enquadramento, as perspetivas de contemplação e os pontos de vista.

Cova da Piedade, Palacete de António José Gomes.
  Assinalam-se o Monumento de Interesse Público (MIP): Palacete de António José Gomes, incluindo o jardim, instalações para animais, cocheira e garagem e a Zona Especial de Proteção.
Imagem: Diário da República, 2.ª série — N.º 182 — 20 de setembro de 2013

Procedeu-se à audiência dos interessados, na modalidade de consulta pública, nos termos gerais e de acordo com o previsto no artigo 26.º da Lei n.º 107/2001, de 8 de setembro, e no artigo 45.º do Decreto-Lei n.º 309/2009, de 23 de outubro, alterado pelos Decretos-Leis n.º 115/2011, de 5 de dezembro, e n.º 265/2012, de 28 de dezembro.

Foi promovida a audiência prévia da Câmara Municipal de Almada. 
Assim: 
Sob proposta dos serviços competentes, nos termos do disposto no artigo 15.º, no n.º 1 do artigo 18.º, no n.º 2 do artigo 28.º e no n.º 2 do artigo 43.º da Lei n.º 107/2001, de 8 de setembro, conju- gado com o disposto no n.º 2 do artigo 30.º e no n.º 1 do artigo 48.º do Decreto-Lei n.º 309/2009, de 23 de outubro, alterado pelos Decretos-Leis n.º 115/2011, de 5 de dezembro, e n.º 265/2012, de 28 de dezembro, e no uso competências conferidas pelo n.º 11 do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 86-A/2011, de 12 de julho, manda o Governo, pelo Secretário de Estado da Cultura, o seguinte:

Artigo 1.º 

Classificação É classificado como monumento de interesse público o Palacete de António José Gomes, incluindo o jardim, instalações para animais, cocheira e garagem, no Largo 5 de Outubro, 34 a 38, Cova da Piedade, freguesia de Cova da Piedade, concelho de Almada, distrito de Setúbal, conforme planta constante do anexo à presente portaria, da qual faz parte integrante.

Artigo 2.º 

Zona especial de proteção É fixada a zona especial de proteção do monumento referido no artigo anterior, conforme planta constante do anexo à presente portaria, da qual faz parte integrante.

9 de setembro de 2013. — O Secretário de Estado da Cultura, Jorge Barreto Xavier. (1)


(1) Diário da República, 2.ª série — N.º 182 — 20 de setembro de 2013

Tema:
Cova da Piedade

Informação adicional:
Direção Geral do Património Cultural: Palacete de António José Gomes
Direção Geral do Património Cultural: Nora de ferro
Diário da República, 2.ª série — N.º 123 — 27 de junho de 2012 (inclui a planta com a delimitação e a ZGP que esteve em vigor até ser fixada a ZEP)

Bibliografia adicional:
Flores, Alexandre M., António José Gomes: O Homem e O Industrial (1847 -1909), Cova da Piedade, Junta da Freguesia, 1992, 175 págs.
Centro de Arqueologia de Almada, Cova da Piedade, Património e História, Cova da Piedade, Junta da Freguesia, 2012.Maria José Pinto, Palácio Gomes: pequena monografia, revista al-madam N.º 4 (IIª Série), Almada, Centro de Arqueologia de Almada, Outubro 1995

Outras leituras:
Nuno Pinheiro no Facebook: Edifícios António José Gomes
Coysas , Loysas, Tralhas Velhas... : Palácio da Viúva Gomes
ruin'arte: Chalet na Cova da Piedade
De regresso ao séc. XIX, Câmara Municipal de Almada